O 20º Índice Global de Liberdade de Imprensa, elaborado pela organização Repórteres Sem Fronteiras (RSF), divulgado em 03 de Maio – Dia Mundial da Liberdade de Imprensa –, posiciona a situação do Brasil entre as dez piores da América Latina. Segundo o estudo, o Brasil não tem muito a comemorar, uma vez que ocupa o incômodo 110º lugar entre 180 países analisados.

 

De acordo com a RFS, o trabalho da imprensa brasileira tornou-se mais complexo, desde 2018, com o presidente da República o atacando regularmente e mobilizando seus apoiadores nas redes sociais: “Trata-se de uma estratégia bem coordenada de ataques com o objetivo de desacreditar a mídia”, conclui a organização.

 

Nesta mesma esteira, algumas figuras públicas que apoiam o governo também operam, publicamente contra os profissionais e a imprensa. O empresário Luciano Hang (*) é um deles. Ele também atua de forma contundente no front judicial que atinge dezenas de jornalistas no país. A cada 26 dias, em média, ele ingressa com um pedido de indenização contra jornalistas. Um deles, o gaúcho Moisés Mendes, responde a três processos que partiram do catarinense.

 

O jornalista – que escreve para os jornais Extra Classe, DCM e Brasil 247, e que já foi colunista e editor especial do jornal Zero Hora – se perfila com o também jornalista gaúcho Flávio Ilha (em matéria do Jornal Extraclasse). Ilha – conhecido por suas passagens por Zero Hora, Correio do Povo, Correio Braziliense, O Globo, Folha de São Paulo, NH e Metro Jornal – foi o primeiro profissional do estado a ser acionado por Hang.

 

Outros profissionais como Samuel Costa Menezes, de Roraima; Lucas Valença (Correio Braziliense), por matéria publicada no portal UOL; a jornalista Josette Goulart e o repórter fotográfico Marcelo Chello Carneiro da Silva (por publicação no canal Lagartixa Diária); Denis Burgierman, editor-chefe do programa Greg News; Patricia Campos Mello (Folha de São Paulo); Fabio Pannunzio e Guga Noblat (ambos por publicação no twitter); Leonel Camasão (Voz da Resistência) e Mirian Leitão (GloboNews) também constam da lista do varejista, assim como José Simão e Fábio Azevedo Pannuzio.

 

Outra vítima do assédio judicial é Luís Nassif (Folha de São Paulo e Portal GGN), cuja condenação de indenizar em R$ 20 mil o dono das Lojas Havan, foi suspensa pelo ministro Dias Toffoli. Em seu despacho, o ministro diz que não existe violação a direitos de personalidade na crítica que os meios de comunicação social dirigem às pessoas públicas, “por mais dura e veemente que possa ser”.

 

A Constituição Federal de 1988 garante o direito à liberdade de imprensa no país e, em geral, o arcabouço legislativo brasileiro é bastante favorável ao livre exercício do jornalismo. No entanto, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS (Sindjors) e a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) advertem que a sociedade deve ficar atenta, pois, ao se tornarem alvos constantes de processos judiciais abusivos, por parte de políticos e empresários, os jornalistas e a própria imprensa se sentem minados na sua profissão, difamados e intimidados, atingindo não só a ambos, mas, em contrapartida, à própria sociedade e à democracia.

 

Como reforça Toffoli: “Não induz responsabilidade civil a publicação de matéria jornalística cujo conteúdo divulgue observações em caráter mordaz ou irônico ou, então, veicule opiniões em tom de crítica severa, dura ou, até, impiedosa, ainda mais se a pessoa a quem tais observações forem dirigidas ostentar a condição de figura pública”.

 

Outra decisão, antes redigida pelo ministro Carlos Ayres Britto, decreta que o exercício concreto da liberdade de imprensa assegura, ao jornalista, o direito de expender críticas a qualquer pessoa, ainda que em tom áspero ou contundente, especialmente contra as autoridades e os agentes do Estado.

 

A ministra Rosa Weber, que também já atuou como relatora em um caso de tentativa de cerceamento à liberdade de imprensa, declarou que o pensamento crítico é parte integrante da informação plena e fidedigna. Para ela, o possível conteúdo socialmente útil da obra compensa eventuais excessos de estilo e da própria verve do autor. “O exercício concreto da liberdade de imprensa assegura ao jornalista o direito de expender críticas a qualquer pessoa, ainda que em tom áspero ou contundente, especialmente contra as autoridades e os agentes do Estado”, completa Rosa Weber.

 

O Sindjors e a FENAJ sustentam que a atividade da imprensa, como formadora de opinião pública, e aplicando o pensamento crítico, é a alternativa real à versão oficial dos fatos. E o trabalho dos jornalistas e das jornalistas não pode resultar em intimidação e ou práticas violentas, pois o cerceamento à liberdade de imprensa é um frontal ataque às instituições brasileiras.

 

O artigo 5º, inciso IV, da Carta Constitucional dispõe: “É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”. É uma norma constitucional, que faz parte das chamadas liberdades públicas, integrante do núcleo intangível da Constituição, por ser um dos direitos inerentes à cidadania e à personalidade.

 

Os fatos acima citados parecem revelar que a intolerância, símbolo da ditadura, nunca de fato findaram, algumas vezes resultado do ativismo político avesso de empresários.

 

(*) Em 17.05.2022 são listados 283 processos no site jusbrasil.com.br, a maioria no TJSC, seguido pelo TJSP, do empresário e da sua rede de lojas.

 

Texto: Rosa Pitsch/Diretoria Sindjors