“Normalmente as ligações, via “zapzap”, começam na madrugada, se alastram pela manhã, tarde e noite, sem intervalo, direto. Para poder dormir, coloco no volume baixo, uso o travesseiro cobrindo a cabeça, mas nem sempre isso resolve…” O desabafo de uma repórter, cujo nome é preservado, de um dos principais veículos de Porto Alegre é igual aos e as demais profissionais que atuam nas redações tanto de jornais quanto emissoras de TVs e rádios.

 

Com o pensamento no bem-estar da categoria, o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS – Sindjors apresentou aos sindicatos patronais, no primeiro semestre deste ano, quando da negociação coletiva 2021/2022, um dos itens da pauta de primordial importância que foi o “direito à desconexão” agregada ao Tele-trabalho e aos demais pontos essenciais que hoje constam na atual Convenção Coletiva. O indicativo da citada pauta não passou da primeira rodada da mesa de negociação. Com isto, os incômodos das ligações com pautas fora do horário comercial continuam persistindo.

 

E é neste cenário que surge o projeto de pesquisa elaborado pela psicóloga Thiele da Costa Müller Castro, doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e Institucional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – Ufrgs. Na pesquisa organizada para ser aplicada junto aos/as jornalistas, Thiele se propõe “olhar os impactos do uso do WhatsApp na vida das pessoas que trabalham, e como este uso está produzindo outras formas de trabalhar, se relacionar e de viver”. Para a psicóloga esta pesquisa se justifica “pelo constante aumento do uso do WhatsApp no trabalho, mesmo não sendo uma tecnologia prevista na prescrição das tarefas dos trabalhadores e das trabalhadoras. Este uso, além de gerar hiperconexão, transforma os modos de trabalhar e viver, impactando na vida das pessoas que trabalham. Por isso, a importância de olhar e discutir sobre seu uso”.

 

Thiele Castro reconhece que o WhatsApp não é a primeira tecnologia de conexão, “muito menos pode ser visto como a porta da inserção das tecnologias no mundo do trabalho, longe disso. Mas o WhatsApp, para mim, foi aquela tecnologia que indiferente ao tipo de trabalho, ao local de trabalho e ao contrato de trabalho, se tornou presente universalmente e indiscriminadamente”. Em pesquisa buscada no Panorama Mobile Time/Opinion Box – Uso de Apps no Brasil, 2020 [1], realizada em dezembro de 2020, aponta que 54% das/os internautas brasileiras/os, com smartphone, afirmam que o WhatsApp é o aplicativo que abrem mais vezes por dia, e 29% dizem que é o aplicativo no qual passam mais tempo.

 

Atualmente, existem 2 bilhões de pessoas utilizando o WhatsApp no mundo inteiro, sendo que mais de 120 milhões usam o aplicativo no Brasil, ele está instalado em 99% dos celulares do país. 79% das/os brasileiras/os usam como principal fonte de informação. Ainda segundo a pesquisa, “cerca de 5 milhões de empreendedoras/es usam o WhatsApp Business. 98% das pessoas usam o app diariamente e 65% têm o hábito de usar o app à noite, pouco antes de dormir. Adultos com mais de 45 anos são os que mais utilizam o WhatsApp no Brasil. Estes dados mostram o quanto este aplicativo está presente no cotidiano das pessoas, e de uma forma muito intensa”.

 

A psicóloga doutoranda pretende entrevistar trabalhadores e trabalhadoras que declarem participar em grupos de WhatsApp relacionados ao trabalho. A entrevista, segundo Thiele Castro, possibilitará que cada sujeito possa falar das experiências e vivências que constituem os seus percursos de trabalho na relação com o WhatsApp, mas também produzir uma experiência ao narrar a si mesmo. “Por que o narrar é experienciar. O narrar é existir, e o narrar é clínico”.

 

Esta parceria Sindjors e a psicóloga Thiele Castro visa desenvolver a pesquisa intitulada: Trabalho e Tecnologia em Sete Tempos que objetiva analisar os modos de trabalhar e de viver que estão sendo performados na interface com o WhatsApp. Esse convite é apenas para trabalhadores e trabalhadoras maiores de 18 anos, disponíveis para participar de uma entrevista individual, on-line, com duração média de 1 hora. Interessados/as em participar, entrem em contato pelo e-mail: thielemuller@msn.com.

 

[1] Panorama Mobile Time/Opinion Box é um conjunto de pesquisas independentes e periódicas sobre hábitos dos brasileiros no consumo de conteúdos e serviços móveis.

 

Texto: Vera Daisy Barcellos/Sindjors