O papel da mídia hegemônica na cobertura de conflitos foi o tema do Fórum Social das Resistências 2022 que aconteceu na sede da Associação Riograndense de Imprensa (ARI), na quarta-feira (27/4), com a participação dos jornalistas Ayrton Centeno, Vera Daisy Barcellos, Denise Mantovani e mediação de Walmaro Paz. Na abertura do evento, a jornalista e diretora da ARI Cláudia Coutinho ressaltou que o Fórum tem como objetivo criar espaço de discussão, articulação e divulgação de todas as formas de resistências criadas por diferentes movimentos, em defesa da democracia e no combate aos problemas que afligem a sociedade, como desigualdade, aquecimento global, urgência da alimentação saudável e segurança alimentar, entre outros. Walmaro justificou a escolha da matéria, “porque é um tema candente no momento, pela atual guerra na Ucrânia e as diferentes versões jornalísticas sobre o que acontece naquele país”.
O presidente da ARI, jornalista José Nunes, leu um manifesto da Associação Riograndense de Imprensa (ARI), intitulado “Liberdade e consciência” que, resumidamente, reafirma a posição da entidade como apolítica, apartidária e na defesa permanente nas liberdades de imprensa e expressão. Salientou que a ARI não apoia candidatos, nem partidos políticos, porque entende que o pluralismo de visões é o caminho mais adequado para uma associação de classe. Após a leitura do manifesto da ARI, Nunes disse ainda que “temos que debater o conflito de guerra, sem apontar o dedo para A ou B. Neste contexto, é melhor fazermos uma reflexão, tomando por base seus reflexos sociais ou econômicos e que, como entidade que congrega profissionais e empresários de Comunicação, em que ambos querem levar o melhor para o seu leitor, ouvinte e telespectador”. Ratificou que o papel da mídia é o de bem informar, porém, em muitos casos impedida, seja pela voz arrogante de um governante ou repressão dos mais diversos setores. “Entendo que o nosso papel ainda é fundamental para a sociedade que luta por uma imprensa livre, verdadeira e democrática”, finalizou o dirigente.
A presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul, Vera Daisy, disse que ficou impactada com o relato de que grandes empresas de comunicação, tem se identificado mais com um dos lados do conflito e que “isto fere o princípio do jornalismo, pois é preciso fazer a escuta e o noticiário veicular os dois lados”.
Editor do site de notícias Brasil de Fato, Ayrton Centeno falou que a questão da propaganda ou jornalismo sobre a guerra não tem o mesmo entusiasmo porque pouca gente consegue entender que o movimento que a imprensa faz é de propaganda. “A cobertura que estamos vendo é como o bem contra o mal e o Putin é encarnação do mal”. Centeno entende que a cobertura do ocidente é capenga e demonstra a vinculação estreita do departamento de Estado norte-americano com os grandes jornais do mundo e que a guerra de hoje é a continuidade do conflito iniciado em 2014, quando houve um golpe contra o presidente legitimamente eleito (Viktor Yanukovych), que não queria entrar na Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte). “A Otan existe para cercar a antiga união soviética por interesse no petróleo da região, e essas coisas raramente aparecem nos jornais e nessa cobertura temos apenas um lado da moeda”, comentou.
Denise Mantovani disse tratar-se de “cobertura subalterna aos interesses norte-americanos”. A jornalista argumentou que há aumento da tensão como elemento de retórica e que a mídia hegemônica detém determinado poder de produzir conteúdo que reverbera num grande número de pessoas, seja pelos veículos tradicionais ou redes sociais. “A notícia é mercadoria e nós somos os consumidores diante um posicionamento das empresas de comunicação”. Ainda, segundo Mantovani, a cobertura da mídia dominante está relacionada a interesses que não percebemos, como fontes que não aparecem ou fontes selecionadas. “Tipo de construção de um jornalismo que se coloca acima dos conflitos. Não é simplesmente reportar, mas editado o que deve ser reportado para o grande público, visões de mundo construídas para naturalizar um lado pelos interesses econômicos, sem percepção do público”, ratificou.
O mediador do painel, Walmaro Paz, representante do Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e a Luta Pela Paz, lembrou que “em outras coberturas de guerra havia no mínimo três agências de notícias, France Presse, Associetad Press e Reuters. Jornalista não é um teórico, a gente escreve o que vê”, finalizou.
O evento foi realizado de maneira presencial e com transmissão ‘ao vivo’ pela internet. Assista o painel, na íntegra, na página da ARI, no facebook.com/imprensars ou no site www.ari.org.br.
Texto/Edição/Imagem: Glei Soares (reg. prof. 8577)