Trabalhadores da FM Cultura e da TVE RS, através de trabalho remoto, mantêm no ar o jornalismo das emissoras públicas
Após um período de incertezas quanto ao futuro da Rádio FM Cultura e da TVE RS no governo José Ivo Sartori (MDB), em que foi encaminhada a extinção das emissoras, os servidores seguem mantendo a resistência para dar continuidade ao trabalho. Contando com o apoio dos sindicatos das duas categorias (radialistas e jornalistas), e com um espaço de diálogo mais acessível com as diretorias, vêm mantendo seu compromisso de levar informação à sociedade gaúcha. Além da programação já restabelecida, a TVE retoma o telejornalismo nesse momento em que a sociedade vive os efeitos do coronavírus.
Na semana em que o estado registra 162 casos de coronavírus confirmados, funcionários e funcionárias das emissoras públicas do estado do RS mantêm a missão de informar a população gaúcha. Para isso, realizam a tarefa através do trabalho remoto e também por escalas. Uma situação atípica nesses 46 anos de TVE e 31 anos de FM Cultura. “O fato de a TVE e a FM Cultura estarem vivas nesse momento, um momento tão delicado, e o fato de nós, funcionários, estarmos podendo trabalhar, fazendo o que a gente gosta e sabe, que é levar informação para as pessoas, é de uma importância enorme. Nós lutamos muito por isso. Respeitar as recomendações de isolamento é fundamental, mas nos manter presentes, ainda assim, também é”, afirma a produtora da FM Cultura, Bruna Linhares.
Desde dezembro de 2016, o governo Sartori foi autorizado pelo parlamento gaúcho para extinguir a Fundação Piratini e outras fundações. A partir de então, os sindicatos representantes das fundações criaram uma frente jurídica, que obteve sucesso na manutenção da maioria das instituições. Com a mudança de governo, houve um acordo para que os servidores concursados não fossem demitidos e as atividades aos poucos fossem retomadas. É o caso da TVE e da FM Cultura, que hoje através de uma parceria entre governo e servidores mantêm todos os equipamentos disponíveis.
Telejornalismo em tempos de isolamento
Entre as atividades retomadas está a do telejornal diário, após mais de um ano fora do ar. A reestreia do noticiário acabou coincidindo com a pandemia do coronavírus. Após uma suspeita, logo descartada, de que um funcionário estivesse com o vírus, a instituição adotou medidas de prevenção e precaução para a equipe. Uma vez que entre os trabalhadores existe um contingente de funcionários com 60 anos, mães e com algum problema de saúde.
Em um primeiro momento, foram afastados do trabalho presencial aqueles funcionários que integram os grupos de risco. Em seguida, essa necessidade de afastamento e de reclusão foi aumentando e veio a necessidade de adaptação de todos para manter a programação no ar, explica Bruna. “No nosso dia a dia normal, nós trabalhamos em equipes mais segmentadas por programas e turnos. Agora, estamos trabalhando conjuntamente como uma grande equipe para darmos conta de abastecer os noticiários com as informações que vão chegando aos montes”.
Desde a extinção da Fundação Piratini, relata a jornalista, editora e delegada sindical da TVE Lírian Sifuentes, os recursos financeiros e pessoais não são mais os mesmos. Mesmo assim, está se conseguindo, a cada dia, melhorar a cobertura. “Desde que tivemos o resultado do exame do colega, estamos em um esforço coletivo, desde as chefias até todos os funcionários, de todas as funções, de como conseguir executar esse papel de informação, garantindo segurança. Há um esforço muito grande de todos os envolvidos. É até bonito de ver, porque fala desse espírito nosso, de todos nós, na defesa da comunicação pública, do povo gaúcho, tentando levar informações que de fato colaborem para nossa sociedade”.
O diretor-geral, Caio Klein, explica que, na atual conjuntura, se priorizou o caráter informativo das emissoras, com o intuito de prestar serviço à comunidade gaúcha. No caso da TV, colocaram no ar o Redação TVE, programa diário veiculado às 13h45 e às 18h30. Para isso foram levados equipamentos até a casa dos âncoras dos telejornais, e os repórteres, via internet, seguem fazendo as matérias, além da colaboração da sociedade que envia material e de relatos de brasileiros no exterior. E estão sendo colocadas no ar reprises do programa Radar.
A repórter e uma das que está como âncora do telejornalismo, Lívia Guilhermano, ilustra como a rotina foi completamente modificada, com um ritmo maior de trabalho. “Estamos nos adaptando para manter duas edições diárias do Redação TVE, um programa informativo que tem focado nas informações sobre o coronavírus, com foco aqui no estado. Para reduzir o deslocamento de funcionários, foram colocados equipamentos na minha casa e na de outros colegas para que possamos entrar ao vivo”.
Para que os programas sejam postos no ar, uma equipe fica na sede da emissora. “Jornalismo é trabalho em equipe e exige uma coordenação conjunta que tivemos que trabalhar, agora à distância. Eu estou aprendendo muito com essa experiência, pois precisamos repensar muitos processos. Nossa reunião de pauta agora é on-line. Estamos pensando em conteúdos que podem ser feitos de casa, como entrevistas por skype e vídeos por whatsapp. A tecnologia possibilita fazer muita coisa e estamos descobrindo novas opções e tendo novas ideias a cada dia. Produzir de casa é também uma forma de mostrarmos para a população a importância de ficar em casa nesse momento e preservar a saúde de todos”.
Rádio com boletins ao vivo
Em relação à FM Cultura, foi priorizada a parte da manhã, feita ao vivo com boletins informativos. Na programação musical, o ajuste de grade e a produção dos programas estão sendo feitas de casa. Presencialmente, até o momento, estão os operadores de áudio e o locutor, que recebem as informações e colocam no ar. “Estamos conseguindo manter uma programação ativa ao vivo, com muita dificuldade, mas estamos trabalhando em conjunto para manter a programação diária”, aponta o diretor.
Bruna, Lírian e Lívia, servidoras concursadas, destacam que, apesar das adversidades, as emissoras cumprem o seu papel como comunicação pública, de ser um canal de prestação de serviço, de informações, de abertura de debates. “Toda a imprensa está fazendo um grande trabalho levando informação, conscientização, e nós, enquanto emissora pública, temos uma grande responsabilidade”, aponta Lírian, destacando os desafios do trabalho remoto. “Estamos fazendo um esforço de conciliação, os cuidados com a saúde e manter o trabalho de informar a sociedade. São iniciativas que nunca tínhamos tido”.
Bruna acrescenta ainda que, além da questão informativa, no caso da rádio há ainda a questão musical. “A área da cultura foi duramente afetada por essa pandemia. Está difícil para quem produz cultura e para quem a consome, já que praticamente todos os eventos culturais foram cancelados. Assim seguirmos tocando os nossos músicos, divulgando a música popular produzida aqui e no restante do país, se torna ainda mais importante agora. Nesse momento difícil, em que estamos todos separados, a programação da rádio pública também cumpre esse papel de ser um alento, uma parceira ” pontua.
Sindicato dos Jornalistas apoia a iniciativa
A presidenta do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do RS (Sindjors), Vera Daisy Barcellos, que durante anos integrou o Conselho Deliberativo da Fundação Piratini, período em que acompanhou o processo de modernização das emissoras, durante a gestão de Pedro Osório, passando pela manutenção do conselho e do funcionamento das emissoras, ressalta o esforço dos funcionários em todo esse processo. “O grande mote está na mão de todos os trabalhadores e trabalhadoras das emissoras, em suas mais diversas categorias. Foram eles que construíram esse projeto, com o aval da diretoria. Foi da vontade dos trabalhadores de colocar a comunicação pública a disposição para a sociedade, da valorização da comunicação pública. É por essa resistência que as emissoras se mantém”.
Frente ao crescente números de casos o Sindicato elaborou recomendações para a saúde de jornalistas enviado a todas as empresas jornalísticas do Estado.
Programação da FM Cultura
Faixa ao vivo, das 7h às 13h. A programação inicia com Café Cultura, das 7h às 9h, depois vem o Cultura Mundi, das 9h às 12h, e em seguida vem o Cultura na Mesa, do meio-dia às 13h. A partir das 13h, faixa musical, sem a presença dos locutores, que normalmente fazem esses horários. Tanto no Café Cultura quanto no Cultura na Mesa, são feitas entrevistas ao vivo sobre temas relacionados ao coronavírus, trazendo depoimentos de pessoas que estão nos países mais afetados pela doença, além de atualizações sobre os acontecimentos da manhã. Ainda durante a faixa, das 7h às 13h, de meia em meia hora. A partir das 15h, também de meia em meia hora, até as 18h, entram boletins reforçando informações importantes do dia.
Fonte: Fabiana Reinholz | Brasil de Fato | Porto Alegre | 26 de Março de 2020 às 19:13 | Edição: Marcelo Ferreira e Katia Marko